ESPECIALIDADES

Clínica de Epilepsia

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Epilepsia

A epilepsia se caracteriza por crises convulsivas de repetição. É um sintoma frequente que acomete em torno de 1 a 2% da população em geral. Além disto, cerca de 4% das pessoas, ou seja, uma em cada 25, já apresentou pelo menos uma crise convulsiva na vida (se não houver crises de repetição não podemos caracterizar como epilepsia, daí a diferença nos números).

Causa e Tratamento

As crises convulsivas se originam de focos ou regiões de mau funcionamento do cérebro. Eventualmente todo o cérebro pode estar comprometido. Este mau funcionamento pode ser decorrente de inúmeras doenças. Algumas são alterações reversíveis, como por exemplo, variação na quantidade de sal das células, outras presentes desde o nascimento, como as malformações do cérebro. Existem também epilepsias associadas à presença de lesões graves, potencialmente fatais, como tumores ou hemorragias cerebrais. Do ponto de vista do paciente, descobrir a doença que causa suas crises é fundamental.

Vale a pena ressaltar que ter epilepsia não implica obrigatoriamente em ter distúrbios de comportamento ou retardo mental. Apesar do preconceito que envolve a doença, existem vários profissionais de todas as áreas que têm epilepsia e usam medicação regularmente.

A função do médico que trata pacientes com epilepsia não se resume no controle das crises, inclui também investigar a doença que as gera.

Existe hoje um extenso arsenal para se tratar crises epilépticas que controlam a grande maioria dos pacientes. Além disso, várias medicações foram lançadas no mercado nos últimos anos com resultados promissores. Nos casos onde existe falha terapêutica com medicação existe ainda a opção do tratamento cirúrgico. O desenvolvimento tecnológico e a melhoria dos métodos diagnósticos têm tornado os tratamentos medicamentosos e as cirurgias cada vez mais seguras e eficientes.

História

As crises convulsivas são descritas na literatura desde os primórdios da escrita. Há mais de 4000 anos já existiam relatos em textos sumérios e egípcios de crises convulsivas. As causas destas crises eram imputadas a espíritos. Apenas no século VI antes de Cristo, a escola hipocrática na Grécia sugeriu que a epilepsia tinha uma causa orgânica, provavelmente de origem no cérebro. Infelizmente, a crença nos “espíritos maus” causando epilepsia prevaleceu na cultura mundial. Somente com o fim da idade media o cérebro voltou a ser revisto como possível causa de doenças.

No final do século XIX a escola inglesa deu grandes contribuições na descrição do quadro clínico e origem de diferentes tipos de epilepsia. Nesta época também surgiram as primeiras cirurgias para remover cicatrizes cerebrais que causavam crises convulsivas.

O grande salto no estudo das epilepsias aconteceu com o desenvolvimento do eletroencefalograma (EEG) em 1929 por um pesquisador alemão. Devido a Segunda Guerra Mundial o aprimoramento do EEG acabou ocorrendo nos Estados Unidos e Canadá.

No Canadá foi criado um dos maiores centros de estudo dedicado ao cérebro no mundo, o Instituto Neurológico de Montreal. Em Montreal foram descritas várias doenças junto com os tratamentos clínicos e cirúrgicos associadas a crises convulsivas. Até a década de 1980 poucos centros no mundo trabalhavam com tratamento cirúrgico e clínico das epilepsias. O alto custo das instalações e os poucos profissionais com formação adequada contribuíam para este quadro. No Brasil o primeiro serviço multidisciplinar criado para o tratamento das epilepsias foi criado em 1971 no Hospital das Clínicas de São Paulo, chefiado pelo Professor Dr. Raul Marino Junior.

No final da década de 1980 surgiram as primeiras Ressonâncias Magnéticas e novas técnicas de filmagem e investigação das crises, que levaram a um melhor conhecimento das doenças ligadas às epilepsias,com um custo mais acessível, levando tratamentos mais adequados a um maior contingente da população. A queda do custo também possibilitou surgimento de novos centros em todo o mundo, o que tem contribuído cada vez mais para os bons resultados alcançados no tratamento desta patologia.

Classificação das Epilepsias

A epilepsia se caracteriza por crises convulsivas de repetição. No entanto, existem vários tipos de crises. Algumas são muito evidentes, como as do tipo grande mal, onde o paciente cai e se debate no chão. No outro extremo existem crises tão sutis que são percebidas apenas por familiares acostumados com os sintomas.

As crises convulsivas devem ser encaradas como sintomas e não como doença. Desta maneira deve-se sempre pesquisar a doença por detrás da epilepsia.

Para investigarmos as doenças que causam epilepsias é necessário que conheçamos bem os vários tipos de crises e as doenças a elas relacionadas. Sabemos que alguns tipos de crises são encontrados com mais freqüência em certas doenças.

É importante o esclarecimento sobre alguns conceitos essenciais para a compreensão das epilepsias. Iremos dividir o capítulo em três tópicos: os tipos de crise e as síndromes epilépticas.

Tipos de crise

As crises convulsivas são a forma mais básica de apresentação das epilepsias. Como foi dito acima, a epilepsia se caracteriza por crises convulsivas de repetição. Um determinado paciente pode apresentar apenas um ou vários tipos de crise. A descrição precisa do quadro, além de como e qual parte do corpo ela acomete inicialmente é peça fundamental para se chegar ao conhecimento de sua causa.

De uma maneira inicial classificamos as crises como generalizadas ou focais. O conceito de focal ou generalizada diz respeito ao envolvimento pela crise de parte ou totalidade do cérebro. Existem ainda crises onde não é possível determinar se elas têm início focal ou generalizado. Elas serão tratadas em seção separada.

Crises Generalizadas

As crises generalizadas podem ser primariamente ou secundariamente generalizadas. As crises secundariamente generalizadas são na realidade crises focais e serão descritas na seção de crises focais.

Crises primariamente generalizadas

As crises do tipo primário acometem o cérebro como um todo desde o seu início. Usualmente os pacientes perdem a consciência de maneira repentina, sem sinal prévio, e só sabem que tiveram crise após ela ter passado. Durante os momentos em que estão inconscientes, os pacientes podem apresentar contrações musculares em todo o corpo ou simplesmente “sair do ar” por alguns segundos. As crises generalizadas primárias são classificadas em ausências típicas, ausências atípicas, crises mioclônicas, crises tônicas, crises tônico-clônicas e crises atônicas.

A-) Ausência típica (também chamada de pequeno mal): crise caracterizada por perda súbita da consciência, interrupção das atividades em andamento e parada do olhar. Usualmente o paciente pára repentinamente de falar, comer ou andar e fica estático. Após alguns segundos retorna a suas atividades sem notar que teve crise. O EEG habitualmente mostra complexos espícula onda de 3 Hz simétricos e bilaterais.

B-) Ausência atípica: neste tipo de ausência a perda e a volta da consciência costumam ocorrer de maneira menos abrupta. O paciente pode também apresentar esboço de movimentos durante a crise. O EEG costuma ser mais variado e mostra complexos espícula onda irregulares ou outras atividades paroxísticas, normalmente de padrão assimétrico.

C-) Crise mioclônica: crises caracterizadas por contrações súbitas, tipo choque, acometendo extremidades ou grupos musculares. Ocorrem mais freqüentemente a noite, no início do sono, ou pela manhã após o acordar. O paciente costuma deixar cair objetos das mãos durante as crises. Nem toda mioclonia é relacionada a epilepsia. O EEG mostra complexos espículas ondas ou ondas agudas.

D-) Crise clônica: crise onde os membros se batem de maneira ritmada, com amplitude mais ou menos constante e envolvem os dois lados do corpo. O paciente pode apresentar intensa salivação. Em geral este tipo de crise faz parte de um quadro onde o paciente inicia com uma crise clônica, evoluiu para uma crise tônica e volta a apresentar movimentos clônicos. Outras vezes a crise se inicia com uma crise tônica e evolui para movimentos clônicos.

E-) Crise tônica: estas crises se caracterizam por contração lenta dos músculos, em alguns casos pode haver extensão dos membros superiores. Um grito costuma preceder o período em que o paciente pára de respirar, os olhos ficam parados, ingurgitados e podem se desviar junto com a cabeça para um dos lados, os lábios ficam azulados . O paciente costuma cair e com freqüência se machuca pois cai rígido ao solo sem se proteger.

F-) Crise tônico-clônica -TCG- (também chamada de grande mal): também chamada de crise tipo grande mal, ela é dos quadros mais dramáticos em medicina. Neste tipo de crise o paciente inicia com uma crise tônica, como descrita acima e evolui para uma crise clônica.

G-) Crise atônica: como o próprio nome diz, esta crise inicia com perda súbita do tônus de todos músculos do corpo levando a imediata queda do paciente ao solo. Ao contrário da queda associada as crises tônicas, nesta crise o paciente cai flácido aumentando as chances de bater com o rosto na mesa ou mesmo no chão. Alguns pacientes que apresentam este tipo de crise com freqüência usam capacetes para evitar ferimentos graves.

Crises secundariamente generalizadas

Ocorrem devido a propagação das crises focais. Elas usualmente começam em apenas uma parte do corpo, como por exemplo a mão ou o rosto, e desencadeiam crises que acabam por acometer todo o corpo. As crises generalizadas secundárias se apresentam como crises do tipo grande mal (TCG) e podem ser confundidas com as crises primariamente generalizadas quando a propagação ocorre de maneira muito rápida,. As síndromes associadas a este tipo de crise serão discutidas na seção das crises focais.

Crises focais

As crises focais acometem inicialmente apenas uma parte do cérebro. No entanto, elas podem se propagar após alguns segundos e envolver todo o cérebro, levando a crises secundariamente generalizadas. Quando as crises focais se generalizam, isto é, se propagam para todo o cérebro, elas se tornam do tipo grande mal (tônico-clônico generalizadas ou TCG) . Eventualmente, durante sua propagação a crise vai se modificando. No século XIX um neurologista inglês chamado Hughlings Jackson descreveu uma crise acometendo inicialmente a mão que propagava sucessivamente para o braço, o rosto, a perna e finalmente se generalizava. Esta crise foi chamada de marcha Jacksoniana e ilustra um foco irritativo envolvendo progressivamente as áreas adjacentes até acometer o cérebro como um todo. Sabemos no entanto que esta “marcha” pode parar em qualquer momento sem necessariamente se generalizar.

As crises focais podem se manifestar de inúmeras maneiras dependendo do local afetado inicialmente. O exemplo da marcha Jacksoniana é um caso típico de envolvimento da área do cérebro comprometida com os movimentos. Caso o foco envolvesse a área da visão as crises poderiam se iniciar com manchas coloridas ou se o foco acometesse áreas de sensibilidade os sintomas seriam apenas formigamentos ou alterações da sensibilidade em determinadas partes do corpo. Podemos concluir que as crises focais se manifestam de maneira muito mais variada que as crises generalizadas, além disto, as manifestações clínicas iniciais são importantes para definirmos o local que se encontra irritado no cérebro. Vale a pena lembrar que determinas áreas do cérebro são relativamente silenciosas, ou seja, não são associadas a sintomas clínicos evidentes, desta forma a crise é percebida somente quando há a generalização. Assim, crises focais podem eventualmente se manifestar muito semelhantes às generalizadas.

As crises focais são classificadas de acordo com o comprometimento ou não da consciência. Elas podem crises parciais simples, quando não há comprometimento da consciência ou crises parciais complexas, quando há comprometimento. Usualmente as crises focais não duram mais que alguns segundos ou poucos minutos. As crises focais podem apresentar sintomas muito variados dependendo da parte do cérebro acometida.

A-) Crises parciais simples: neste tipo de crise não há perda da consciência. Os sintomas podem variar enormemente dependendo do local do cérebro acometido. Para facilitar a localização de onde a crise se inicia dividimos este tipo de crise dependendo do sintoma inicial.

1. Crises com alterações motoras: parada da fala, movimentos clônicos ou tônicos da cabeça, braço, olhos, etc.

2. Crises com alteração da sensibilidade: formigamento nos membros, manchas visuais, cheiro ou gosto estranho sem relação com o meio, zumbido, etc.

3. Crises com distúrbios autonômicos: alteração da pulsação do coração, suor, palidez ou rubor cutâneo, dilatação da pupila.

4. Crises com alterações psíquicas: distorções da percepção do meio como por exemplo sensação de estranheza em lugares conhecidos ou de conhecer lugares desconhecidos, alteração da forma ou cor dos objetos, sensação de sair do corpo, medo ou euforia inexplicados ou distorções na percepção do tempo.

B-) Crises parciais complexas: o termo complexo aqui significa a perda da consciência durante a crise. Elas podem ser precedidas ou não por uma crise parcial simples.

1. Precedidas de crises parciais simples: Estas crises se iniciam com uma das crises descritas acima e então evoluem com perda de consciência e movimentos estereotipados, sem propósito, chamados de automatismos. Os automatismos costumam ser movimentos muito complexos como abotoar camisa, segurar pessoas ou objetos, continuar a escrever ou desenhar ou mesmo continuar a dirigir um veículo ou bicicleta. Devemos notar que no caso das crises parciais simples com alterações motoras (descritos no item anterior) os movimentos se caracterizam apenas por movimentos de balançar ou endurecer uma parte ou região do corpo.

2. Sem ser precedidas por crises parciais simples: neste tipo de crise o paciente perde a consciência desde o início da crise e apresenta automatismos.

C-) Crises parciais com generalização secundária: neste tipo de crise o paciente pode apresentar inicialmente uma das crises descritas nos itens (a) ou (b) e evoluir para uma crise tônico clônica generalizada (descrita junto com as crises primariamente generalizadas). As vezes a propagaçao da crise ocorre tão rapidamente que ela é confundida com um crise primariamente generalizada.

Síndromes Epilépticas

A maioria dos pacientes apresenta um conjunto de diferentes crises em vez de apenas um tipo. Quando este conjunto de crises é associado a outras características, como por exemplo idade, traçado típico no eletroencefalograma ou história familiar, chamamos este conjunto de síndrome epiléptica. Podemos notar que as síndromes epilépticas são apenas agrupamentos de padrões de crises e dados clínicos. Assim, algumas doenças podem estar associadas a mais de uma síndrome epiléptica e algumas síndromes epilépticas podem estar associadas a mais de uma doença. Apesar das síndromes não serem precisas quanto a origem da doença elas são pistas importantes para direcionar a investigação e tratamento dos pacientes.

As síndromes epilépticas são classificadas de acordo com os tipos predominantes de crise apresentados pelo paciente. Além dos tipos de crise é importantes a caracterização da idade de início e EEG associado. As síndromes epilépticas são divididas inicialmente em dois grupos: um onde há predomínio das crises generalizadas e outro onde predominas as crises focais. Não cabe aqui uma descrição profunda de todas as síndromes descritas em epilepsia, citaremos apenas as mais comuns em nosso meio. Para os interessados em uma classificação completa indicamos a leitura do artigo da comissão da liga internacional contra a epilepsia publicada na revista Epilepsia, ano 1989 número 30, páginas 389 a 399.

A-) Síndromes associadas às crises generalizadas:

1. Sem lesão cerebral definida (idiopática):

i. Epilepsia de ausência infantil: Esta síndrome se apresenta com crises de ausência típica que surgem na idade escolar (em torno de 6-7 anos). A apresentação habitual é a criança que começa a não ir bem na escola. As crises se iniciam e terminam subitamente e duram poucos segundos, não sendo percebidas pela criança. Podem ocorrer dezenas de crises por dia. Algumas vezes os colegas ou o professor notam períodos em que ela pára o olhar, perde o contato com o meio e volta ao normal após segundos. Como recebe informações entrecortadas, o paciente apresenta dificuldade para compreender as aulas e começa a ter notas baixas. O EEG costuma ser característico com atividade simétrica bilateral de espículas-onda de 3 Hz sobre um traçado de fundo normal. Durante a adolescência a criança pode parar de ter crises ou desenvolver crises tônico clônicas. Existe um importante fator genético nesta doença.

ii. Epilepsia de ausência juvenil: Esta síndrome cursa com crises de ausência típica porém menos freqüentes que na ausência infantil, usualmente a criança apresenta menos de uma crise por dia. A idade de apresentação costuma ser mais tardia, próxima a puberdade. A associação com crises TCG é freqüente, ocorrendo normalmente pela manhã após o paciente se acordar. Pode eventualmente apresentar crises mioclônicas. O EEG costuma ter espículas-onda com freqüência superior a 3Hz.

iii. Epilepsia mioclônica juvenil (EMJ): A EMJ tem como característica as crises de ausência, que se iniciam próximo a puberdade, acompanhadas de abalos mioclônicos, envolvendo os dois lados do corpo, mais freqüentemente pela manhã. Durante os abalos mioclônicos não há alteração da consciência. Usualmente o paciente começa a deixar cair, ou arremessar involuntariamente, copos e utensílios domésticos no café da manhã. Os sintomas são mais evidentes quando ocorre privação de sono ou durante fotoestimulação. Este tipo de crise se associa a crises do tipo grande mal e costuma responder bem ao tratamento medicamentoso.

2. Com lesão cerebral associada:

i. Síndrome de West: esta síndrome se caracteriza pela tríade de espasmos infantis, parada do desenvolvimento neuropsicomotor e hipsiarritmia no EEG. A idade de apresentação costuma ser entre o quarto e sétimo mês de vida. Usualmente as crianças têm precedente de extensa lesão cerebral, normalmente por falta de oxigênio no parto, porém em alguns casos a lesão pode não ser evidente ou conhecida.

ii. Síndrome de Lennox-Gastaut: Esta síndrome se manifesta em crianças entre 1 e oito anos de vida. Os tipos mais comuns de crise são as tônicas, as atônicas e as de ausência, podem, no entanto, também ocorrer crises tipo TCG, mioclônicas ou focais. As crises são muito freqüentes e o EEG mostra ritmo de fundo anormal com espículas-onda lentas de menos de 3 Hz. Usualmente o paciente tem retardo mental e as crises são de difícil controle.

B-) Síndromes associadas a crises focais. Nestas síndromes devemos sempre investigar presença de lesões cerebrais, como tumores ou malformações, com exames de imagem adequados.

1. Epilepsia frontal: As crises relacionadas ao lobo frontal costumam ser parciais simples ou complexas com generalização secundária. As crises costumam ocorrer diversas vezes por dia e freqüentemente durante a noite. Algumas características são freqüentes como a curta duração, pouca ou nenhuma confusão após as crises, a propagação rápida com generalização secundária, predomínio de sintomas motores com postura tônica e quedas ao solo. O lobo frontal é maior dos lobos cerebrais e engloba diversas áreas que podem se manifestar com algumas peculiaridades dependendo de onde a crise se inicia. O EEG pode, ou não, revelar o lado afetado pela doença.

2. Epilepsia Temporal: A epilepsia do lobo temporal é uma das causas mais comuns de epilepsia refratária a medicação. As crises comumente associadas a este são lobo são as crises parciais simples autonômicas e psíquicas. Normalmente o quadro evolui com crises parciais complexas e menos freqüentemente para TCG. Durante a crise parcial complexa a pessoa costuma apresentar olhar distante, movimentos mastigatórios, deglutição de saliva e, movimentos sem propósito com as mãos. Usualmente segura alguma coisa, abotoa a camisa, ou passa a mão ao esmo. Em alguns casos as crises podem ser bastante elaboradas como ficar folheando páginas ou dirigindo bicicleta ou carro. O risco de acidente é grande nestas situações, pois não há interação adequada do paciente com o meio. As crises do lobo temporal terminam geralmente seguidas por um período de confusão mental que pode ser prolongado. A epilepsia do lobo temporal freqüentemente é associada a esclerose mesial temporal.

3. Epilepsia parietal e occipital: As crises convulsivas que se originam nos lobos parietal e occipital são menos freqüentes que as originadas nos lobos frontal e temporal e serão descritas em conjunto. As crises que se iniciam no lobo parietal se caracterizam por alterações sensitivas e costumam evoluir rapidamente para crises tipo grande mal. As occipitais se caracterizam por alterações visuais como manchas escuras ou coloridas precedendo as crises tipo grande mal. As epilepsias relacionadas a lesões nos lobos parietal e occipital podem se apresentar com quadros clínicos semelhantes aos das crises que se originam nos lobos frontal ou temporal, dependendo do caminho de propagação da crise.

Lesões Cerebrais

Nosso cérebro possui mecanismos de proteção contra crises convulsivas. Para se ter convulsões é necessário que algum fator ou fatores de agressão (usualmente representados por lesões cerebrais) superem as defesas naturais do organismo. Desta maneira, uma mesma doença pode se apresentar com crises convulsivas em uma pessoa e não ter sintomas em outra. Existem assim epilepsias onde o fator de agressão é o mais importante e sua remoção pode levar à cura das crises, existem também, por outro lado, epilepsias onde a defesa do organismo é que é muito frágil sendo necessário melhorá-la para se controlar as crises. Usualmente, as crises são geradas por uma somatória entre estes dois fatores e o tratamento deve ser direcionado tanto para tratar o fator de agressão como para aumentar a defesa do organismo.

As lesões que causam epilepsias podem ser divididas em difusas ou focais. As lesões difusas acometem o cérebro como um todo enquanto as focais acometem apenas uma parte do cérebro.

Lesões difusas que podem causar epilepsia. Usualmente as lesões difusas são decorrentes de agressões que acometem todo o cérebro, como por exemplo quando há falta de oxigênio ou nutrientes durante a formação da criança ainda no útero da mãe, no parto ou na infância. No entanto, nem todos os casos são relacionados a fatores de agressão. Algumas doenças são devido a alterações celulares determinadas geneticamente. Infelizmente algumas lesões não são vistas nos exames de imagem atuais, e o diagnóstico deve ser feito com base na história, achados de EEG e evolução da doença.

Lesões focais que podem causar epilepsia. As lesões focais devem ser sempre investigadas no caso de epilepsias. Os tipos mais comumente associados às epilepsias são doenças crônicas de crescimento muito lento, como os tumores cerebrais benignos e as malformações vasculares ou corticais. No caso da epilepsia do lobo temporal a esclerose mesial temporal é causa comum de refratariedade a medicação anti convulsivante.

Tumores cerebrais: Qualquer tumor cerebral pode se manifestar inicialmente com crises convulsivas. Todo paciente que começa a apresentar crises convulsivas na idade adulta deve ser investigado com o intuito de se afastar tumores como causa das convulsões. No entanto, existem alguns tumores de crescimento lento que podem estar associados a epilepsias com anos de evolução. Os tipos mais comuns são os Oligodendrogliomas, os Tumores Disembrioblásticos Neuro-epiteliais (DNET), os Gangliogliomas e os Gangliocitomas. Existem também lesões de crescimento tão lento, que se questiona se são tumores verdadeiros, como os Hamartomas. Em geral a retirada por completo dos tumores deixa 80% dos pacientes livres de crises.

Malformações vasculares: Dois tipos de malformações vasculares são freqüentemente associados a epilepsias: os angiomas cavernosos (também conhecidos como cavernomas) e as malformações arteriovenosas (ou MAV). Os cavernomas são altamente epileptogênicos e frequentemente causam crises de difícil controle medicamentoso, por outro lado, eles também podem se manifestar no organismo com sangramentos que podem gerar dor de cabeça ou paralisias de membros. A localização e o tamanho dos cavernomas, juntamente com o tipo e intensidade dos sintomas, deve ser levado em conta na hora de se optar pelo tratamento mais adequado. No caso das malformações arteriovenosas a presença, ou não, de epilepsia não costuma ser o mais importante no quadro clínico.O risco de sangramento é maior que no cavernoma e as seqüelas neurológicas mais comuns.

Malformações cerebrais: Existem dezenas de diferentes tipos de malformações cerebrais. Algumas cursam com crises convulsivas enquanto outras são acompanhadas de retardo mental de intensidade variada. Nos últimos anos nosso conhecimento a respeito das malformações tem aumentado graças a melhoria dos métodos de imagem, principalmente a ressonância magnética, que tem sido capaz de identificar cada vez mais lesões imperceptíveis pelos métodos antigos. As malformações associadas a epilepsias podem ser dividas em distúrbios de migração e de organização neuronal. No grupo com distúrbios de migração estão as lisencefalias e as heterotopias. Entre as patologias associadas a desorganização dos neurônios estão a polimicrogiria, as microdisgensias e as displasias focais. Existe também um terceiro grupo de malformações cerebrais que envolve não apenas o neurônio, mas as células ao redor deles, chamadas de glia. Neste grupo encontramos a hemimegaloencefalia.

Esclerose mesial temporal (EMT). A EMT é um achado freqüente nos pacientes com epilepsia do lobo temporal. A esclerose mesial temporal não tem nada a ver com o termo “esclerosado”, usado no meio leigo como sinônimo de demência. A EMT se caracteriza por atrofia de partes do hipocampo, amígdala e estruturas localizadas na parte mais interna do lobo temporal (medial em contraposição a lateral). Apesar de ter sido descrita há quase 200 anos, ainda persistem dúvidas quanto ao seu papel na epilepsia. Acredita-se hoje que esta alteração esteja relacionada à maior gravidade das crises, no entanto, crises repetidas podem piorar a atrofia da EMT. Desta maneira podemos dizer que a EMT pode ser causa e conseqüência das crises epilépticas. Resta ainda dizer que não é obrigatória a associação entre EMT e epilepsia, algumas pessoas podem apresentar EMT e não apresentar epilepsia.

Cicatrizes cerebrais: Alguns traumas cranianos podem causar cicatrizes no cérebro que podem levar a crises convulsivas. Raramente estes quadros levam a epilepsias de difícil controle medicamentoso.

Cirurgia para Epilepsia

Como vimos anteriormente, grande parte das epilepsias está associada a presença de lesões cerebrais. O tratamento cirúrgico consiste na remoção da lesão preservando o cérebro e suas funções. As cirurgias mais freqüentes em serviços especializados em epilepsia são a ressecção temporal anterior (lobectomia temporal), as remoções de lesões corticais guiadas por eletrocorticografia e as hemisferectomias. Existem ainda procedimentos paliativos que visam facilitar o controle das crises, sem no entanto ter a intenção de as curar.

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